“Era uma vez no Brasil” pretende constituir uma série de comentários pessoais sobre a campanha e o sufrágio no Brasil.
Para começar, há que reconhecer um conjunto de factos indispensáveis a qualquer análise, traçada de forma bastante rude por um observador externo e não muito profundamente conhecedor da realidade brasileira.
O primeiro é a natureza do país em questão: com 190 milhões de habitantes, o Brasil é o quinto país mais populoso do mundo, com uma extensíssima área e uma grande riqueza em termos de recursos naturais (possui entre 15 a 20% da biodiversidade mundial), com uma enorme costa virada para o Atlântico, etc. A sua economia é, também por isso, bastante potente, ainda que as desigualdades sociais continuem a marcar o panorama nacional, assim como alguma dificuldade de governação, principalmente em algumas cidades muito povoadas, verdadeiras mega-cidades, onde problemas de educação, integração e segurança são comuns. Relativamente à educação, é de destacar o relatório de 2008 do Banco Mundial, segundo o qual as lacunas na formação da população brasileira serão um fortíssimo constrangimento ao seu desenvolvimento como grande potência, o que a deixará atrás de outros países emergentes com melhores resultados a este nível.
“We should be ashamed of ourselves,” said Ilona Becskeházy, executive director of the Lemann Foundation, an organization based in São Paulo devoted to improving Brazilian education. “This means that 15-year-olds in Brazil are mastering more or less the same skills as 9-year-olds or 10-year-olds in countries such as Denmark or Finland.” (NYT, 4 de Setembro)
O segundo é o seu posicionamento face ao continente onde se encontra: o Brasil, que ocupa quase metade do território do continente sul-americano, tem fronteiras com praticamente todos os países da América do Sul (a excepção do Chile e do Equador). Está bastante envolvido no processo de integração de todo o continente, do qual se percepciona, pelas características acima, líder natural. Medeia conflitos, apoia e condena, propulsiona o Mercosul e influencia a vida de todos os países que o cercam.
Terceiro – a sua posição no mundo: pois, para além de ser uma potência regional clara, também é uma potência internacional. Em ascensão, eu diria, mas não deixa de o ser. Faz parte dos chamados BRIC, sendo, na realidade, membro fundador da ONU, membro do G20, do CPLP, da União das Nações Sul-Americanas, do Mercosul,… A sua política externa tem vindo a fazer-se sentir com maior intensidade nos últimos anos, uma vez que o país tem sabido fazer valer as duas realidades que apresentámos atrás para seu benefício em termos internacionais. Por exemplo, Lula continua muito empenhado em obter da ONU um assento permanente no Conselho de Segurança. Para além disso, o reforço das suas relações com países como a China, a Rússia e a Índia ou com o continente africano, reforçam essa sua posição. Arriscaria a dizer-me que funciona como interlocutor entre as grandes potências (das quais eventualmente ainda não fará ortodoxamente parte) e os médios e pequenos países, com os quais se sente identificado (passado colonial, solidariedade, proximidade cultural, etc.). Esse foi o caso da mediação, juntamente com a Turquia, do caso nuclear iraniano; e não se coibiu de fazer alianças com países que parecessem menos populares no concerto internacional – exemplo do negócio de armamento com os russos.
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