terça-feira, 3 de maio de 2011

A morte de Osama bin Laden II

Ora bem, voltando ao assunto de ontem com uma perspectiva internacionalista, não quero repetir o que já foi lido imensas vezes, mas lançar uma série de comentários que me parecem apropriados.

Em primeiro lugar, a grande questão prende-se com as relações Paquistão-EUA: afinal, o que os Estados Unidos fizeram foi uma clara ingerência em território paquistanês e, sem as autoridades daquele país saberem, invadirem uma casa e matarem alguns homens. Até que ponto o Paquistão estará disposto a passar por cima disso?

Por outro lado, afinal como é possível que tantos serviços de inteligência estivessem no encalço de Bin Laden e só dez anos depois o tenha descoberto precisamente numa mansão (quem não o imaginava num Bunker tipo Hitler, debaixo de terra, com um batalhão de homens armados ao seu redor?) a alguns quilómetros de uma base militar paquistanesa e a pouca distância da capital do país? Falhas? Jogos diplomáticos? Cooperação paquistanesa? Mentira americana? Mataram Bin Laden e mais duas ou três pessoas apenas? Não havia homens armados prontos a proteger o líder da organização? Neste momento, não consigo responder; e duvido que o possa fazer nos próximos tempos.

Os russos, muito afeiçoados a teorias da conspiração contra os americanos,  dizem que as fotografias e o Photoshop, o corpo atirado ao mar e coisas afins não passam de uma encenação americana; mais uma vez, lançam as dúvidas ao ar para minar a confiança em Washington e nós ficaremos com elas. Mas, de facto, fazer uma cerimónia fúnebre dentro de um avião e atirar o corpo ao mar soa-me de forma tão estranha que a minha mente se torna incapaz de fazer qualquer análise objectiva e ponderada sobre a questão.

Regressando a assuntos sérios, para além do futuro das relações com o Paquistão, o futuro da própria Al-Qaeda está em cima da mesa – não sou especialista em terrorismo e deixo o assunto a quem dele percebe verdadeiramente (e vários teóricos debruçam-se sobre ele aqui), mas aquilo que sei é suficiente para afirmar que a morte de um líder emblemático de uma organização transnacional terrorista, o seu fundador e desde sempre líder, não traz necessariamente um arrefecimento na actuação dessa mesma organização; muito pelo contrário, as bases, inflamadas pelo ataque do inimigo, do infiel, poderão muito facilmente reatar as suas paixões mais anti-ocidentais e envolver-se activamente em ataques de variada natureza. Para mim, a morte de Bin Laden foi o acender de um rastilho e não, como muitos afirmam, suficiente para trazer mais segurança ao mundo.

Não podemos igualmente esquecer-nos que os terroristas vivem da mediatização; da transmissão ao mundo do sofrimento que causam em nome de um ideal – e essa mediatização está agora a ser-lhe dada e continuará nos próximos dias; a causa islâmica fundamentalista está no foco das atenções, como tanto gosta e de que tanto precisa.

Para terminar, deixo aqui algumas questões para reflexão: será este o momento dos islâmicos mostrarem ao mundo como não têm nada a ver com organizações como a Al-Qaeda? Distanciar-se das acções deste grupo terrorista que tantos muçulmanos matou e que, segundo muitos estudiosos do Corão, interpretam erroneamente o seu conteúdo?

Considero este excerto do Público especialmente importante:

“O homem que ajudou Osama bin Laden e Ayman al-Zawahiri a criar a Al-Qaeda e se tornou no primeiro teórico da guerra santa disse, num novo manifesto, que “é proibido cometer actos de agressão, mesmo que os inimigos do islão o façam”. A revisão da sua doutrina criou ondas de choque dentro e fora do movimento islamista. 

Uns avaliaram que a organização ficou ferida de morte, porque foi abandonada pelo guru que legitimava o terrorismo. Outros desvalorizaram a influência de um veterano jihadista sobre uma nova geração da Internet que talvez nunca tenha ouvido falar nele. Outros ainda distinguiram entre uma crítica à estratégia e o (não) abandono dos objectivos finais.

A “deserção” do Dr Fadl tornou-se conhecida, em Maio de 2007, quando fez chegar um fax ao jornal árabe Asharq al-Awsat exortando a que as operações da jihad fossem levadas a cabo segundo a Sharia (lei islâmica). E a Sharia, assegura este cirurgião de 58 anos, não aprova o assassínio de civis e de estrangeiros, o uso de escudos humanos (raptos), o roubo e destruição de propriedades. Estes crimes são contraproducentes e devem cessar, sentenciou, citando o Corão: “Combatam pela causa de Deus os que vos combatem, mas não ultrapassem os limites, porque Deus não ama os transgressores”.


A minha última referência vai agora no sentido desta ligação que contém algumas afirmações atribuídas a Bin Laden, que provam tão simplesmente que este homem (e outros que o seguem) era um mentecapto.

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