O Afeganistão tem estado na agenda mediática internacional. E então a partir da próxima Terça-feira, com o anúncio, já esperado, de Barack Obama, é que as referências a este país da Ásia Central vão disparar. No meu artigo de hoje, gostava só de fazer referência a uma questão histórica que considero fundamental para a análise de qualquer fenómeno afegão actual – é este recurso à interdisciplinaridade que enriquece o conhecimento da realidade.
A população afegã é uma população massacrada pela guerra e pela conflitualidade. Todos os que, actualmente, têm cerca de 30 anos de idade passaram a totalidade (atenção, a totalidade!) da sua vida em guerra. Desde 1980 que o Afeganistão se encontra, quase ininterruptamente, em estado de guerra, com todas as implicações económicas, políticas e principalmente sociais que um contexto caótico desta natureza acarreta.
Muitos criticam países distantes como este pelo seu fanatismo, pela lógica anti-Ocidental ou pela instabilidade e corrupção que não conseguem controlar. Mas para uma análise destas, já para não falar de um eurocentrismo acrítico, só podem esquecer-se do “pormenor” que é a história nacional afegã.
De 1980 a 1988, no tempo da Guerra Fria, foram invadidos pela União Soviética. Seguem-se tempos de oposição entre o fundamentalismo islâmico e o comunismo que entretanto se tinha instalado no país, com a tentativa de implementar o primeiro movimento pan-islâmico transnacional, apoiado pela Arábia Saudita e pelo Paquistão.
Com a implosão da URSS, vem uma guerra interna, entre tarifas afegãs, ou seja uma guerra entre minorias étnicas dentro do próprio país. Quando este conflito se resolve, logo surge uma guerra de natureza religiosa, onde os Taliban (afegãos e paquistaneses) tentam impor um regime islâmico e fundamentalista, constituindo naquele território o seu “santuário” – na denominação do Prof. Carlos Gaspar num dos seus artigos na revista “Relações Internacionais” do IPRI.
Os Taliban sobem ao poder e logo em 2001 intervêm os Estados Unidos naquela que era uma guerra civil, apoiando, naturalmente, as forças afegãs anti-Taliban, que conseguiram, efectivamente, derrotar aqueles que governavam o país, colocando Karzai na liderança do Afeganistão.
Ora, independentemente da posição que se tenha relativamente à intervenção quer da URSS nas décadas de oitenta e noventa quer a dos EUA já no século XXI, a verdade é que, se pensarmos na população, nos indivíduos, nas famílias, nos grupos sociais, nas interacções, na socialização, etc., parece-me extremamente difícil não se compreender a adesão a extremos. Viver desde o nascimento num país constantemente em guerra não pode gerar indivíduos emocionalmente equilibrados. Há todo um conjunto de fenómenos, que se prendem com necessidades básicas de segurança e de desenvolvimento pessoal que conhecem, nestes períodos, lacunas significativas e marcantes do ponto de vista das narrativas pessoais. A transição democrática demora mais do que uma década e os milagres não acontecem numa sociedade dilacerada.
Obama dizia, em 2007, que quando alguém tem oportunidades e estabilidade, dificilmente se alia a radicalismos. Nisso, tenho que concordar. E os Taliban, por muito que incarnem uma perspectiva específica, não são, de todo, saudáveis para nenhuma indivíduo – mesmo que se seja contra o Ocidente. E a libertação do Afeganistão deste grupo (quer se o considere terrorista ou não) é, para mim, uma necessidade.
fala sério
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